Três hipóteses são mais aceitas na arqueologia a respeito da teoria que surgiu nas redes sociais sobre uma “cidade perdida” e que seria uma “capital do mundo” chamada de Ratanabá, na qual uma parte dela estaria em Apiacás, a 1.005 km de Cuiabá. A possibilidade mais recente afirma que as linhas observadas na floresta poderiam ser valas feitas por indígenas para proteger as aldeias das invasões de outros povos, de acordo com arqueólogos ouvidos pelo g1.
As outras duas explicações seriam as formações geológicas naturais e o desenho de geoglifos na região.
No entanto, as menções às grandes pirâmides, cidades de ouro perdidas e com antigas civilizações não entram no radar da arqueologia e servem apenas para atiçar a imaginação, de acordo com a arqueóloga e fundadora do Museu de História Natural de Mato Grosso, Suzana Hirooka.
De acordo com a literatura da área, o máximo que já encontraram são vestígios de cerâmicas em rochas de rio e desenhos nas cavernas ou em paredes rochosas, conhecidos como rupestres, o que costuma ser comum para os arqueólogos.
As hipóteses consideradas pela arqueologia:
- Estruturas geológicas naturais;
- Geoglifos;
- Possíveis valas indígenas.
Uma possibilidade considerada pela arqueologia seria de que aquelas marcações poderiam ser valas cavadas pelos indígenas como método de defender a aldeia contra invasões de outras etnias, de acordo com Suzana Hirooka.
“No Xingu, existem valas no entorno das antigas aldeias, que podem sugerir fossos de defesas”, afirmou.
Ela ressaltou, no entanto, que apenas uma pesquisa de campo feita por arqueólogos pode confirmar, de fato, essa hipótese.
À época, os povos originários lutavam constantemente entre si, o que pode explicar o isolamento de alguns grupos.
Segundo o estudante de arqueologia e primeiro indígena do Xingu a entrar nesta área, Kamarifé Raôry Waurá, as marcas vistas podem ser antigas defesas indígenas. No entanto, nada tem haver com grandes civilizações ou cidades perdidas com ouro, como dizem as teorias na internet.
“As linhas seriam valas para impedir o avanço dos inimigos nas aldeias. É uma das hipóteses. Não tenho dúvida que os ancestrais faziam isso. Eles gostavam de guerrear, assim como outros povos, não só os indígenas. Dentro da vala, eles colocavam pedaços de árvore, tipo uma cerca, por isso eram chamados de Ajatapipoho, porque cercavam a aldeia”, explicou.
As insinuações de que esses achados seriam de uma “cidade perdida” não fazem sentido e não passam de especulações, de acordo com Suzana.
“Essa ideia da cidade, das pirâmides e das ruas não passam de especulações. O máximo que houve foi uma navegação em cima de imagens de satélites e que se chegou a essas conclusões. Não é incomum encontrar falhas geológicas com alinhamentos. Não é incomum achar formações rochosas e empilhamento de tijolos, de paredes ou com formas semelhantes a pirâmides. Isso é comum, principalmente em região de rochas sedimentares, onde há facilidade de erosão e encontra certas estruturas no relevo”, afirmou.
Segundo ela, a falta de divulgação científica pode abastecer as teorias errôneas sobre a região e, consequentemente, atrapalhar o trabalho dos arqueólogos.
“É uma região muito pouco ocupada, então, a floresta está bastante virgem. Nos registros mais antigos arqueológicos datam de 27 mil anos, com Santa Elina, em Rosário Oeste, porque é a segunda ocupação mais antiga do país e uma das mais antigas da América do Sul. Isso já entra no período do pleistoceno, final da última era de gelo. Então, quando um grupo de pesquisadores amadores falam em 400 milhões de anos [sobre Ratanabá], é uma conclusão precipitada e mostra o quanto a falta da divulgação da ciência pode trazer consequências bastante danosas para a arqueologia”, disse.
De acordo com Suzana, a região da Amazônia está repleta de antigos sítios arqueológicos e grande parte deles são de antigas aldeias indígenas que ainda não foram estudadas por estarem em locais de difícil acesso.
“É triste ver o que essa falta de conhecimento faz com as pessoas acreditarem de uma forma tão cega em uma coisa absurda, porque há 400 milhões de anos não há nem cogitação em presença humana. A divulgação da ciência deve ocorrer, principalmente nessas regiões”, ressaltou.
Segundo ela, o potencial de descobertas na região tratam de possíveis grandes aldeias, com artefatos de cerâmicas, de agricultores e artistas que manifestavam seu modo de vida através de desenhos rupestres gravados nas rochas.
“Os achados não vão fugir dessa faixa de tempo de, no máximo, desde o primeiro homem descoberto em Mato Grosso há 27 mil anos. Quando a gente fala em ceramistas, datam de 8 mil para frente. Já de caçadores-coletores, são de 27 mil anos, que não dominavam ainda a domesticação das plantas e animais”, explicou.
Rogério Júnior e Kethlyn Moraes – G1 MT