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A necessidade da cultura de paz

ARTIGOSArmas geram violência. Não cabe ignorar os fatos e enveredar por caminhos que nos levem ao retrocesso. Mesmo assim, está de volta à agenda política de nosso país a tormentosa discussão sobre a legalização generalizada do porte de armas de fogo.
Esse debate é promovido, de modo difuso, por categorias que pretendem obter para seus integrantes o direito de andar armados e pela indústria armamentista, que espera ampliar seus lucros.
Surfando no discurso da insegurança, alguns querem flexibilizar as vedações impostas pelo Estatuto do Desarmamento. Em geral, as armas são proibidas para a população, salvo em casos excepcionais, com previsão legal.
Atualmente, qualquer cidadão pode requisitar autorização para possuir uma arma e, depois, para andar armado – mas é muito difícil de obtê-las. É assim que deve ser.
Lamentavelmente, uma comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou, recentemente, o texto inicial de uma proposta que pode representar o fim do Estatuto do Desarmamento, caso seja bem sucedido nas próximas etapas da tramitação legislativa.
O projeto autoriza o porte de armas para membros do Poder Legislativo e para a polícia legislativa.
O projeto também possibilita a compra de arma pelos que respondem a inquérito policial ou a processo criminal e reduz de 25 para 21 anos a idade mínima exigida para que alguém compre armas e munições.
É preciso tratar com mais cautela e reflexão um tema tão sensível. Armas devem ser utilizadas pelos órgãos de segurança, não pelos particulares nem tampouco por categorias profissionais isoladas.
Corremos o risco de ver criadas novas milícias atuando de forma concorrente às forças do Estado – que, infelizmente, têm protagonizado casos sucessivos de abuso contra a população.
Não precisamos aumentar a dose de violência. O cidadão comum é que fica sob a linha de fogo.
A OAB é contra que advogados ganhem o direito de andar armados pelo fato de terem essa condição profissional.
Para a equiparação com outras categorias, como a dos integrantes da magistratura e do Ministério Público, o correto seria retirar a autorização automática que os juízes e procuradores têm para portar armas. É preciso analisar cada requisição caso a caso.
O respeito e o fortalecimento das instituições é o caminho correto para lidar com os problemas vividos por nosso país.
A cultura de paz precisa ser fortalecida. Há momentos em que esses ideais precisam ser reforçados.
O Brasil, assim como o restante do mundo ocidental, viu-se surpreendido e atingido pelos bárbaros atentados praticados contra Paris – até porque cidadãos brasileiros foram feridos a bala na capital francesa.
Temos uma oportunidade, agora, de reagir de acordo com os valores do Estado Democrático de Direito. Um dos debates que se faz, neste momento, na Europa, é justamente sobre restringir ainda mais o porte e o comércio de armas. Como o Brasil vai se colocar nessa discussão?
Nos Estados Unidos, o presidente Barack Obama também está engajado em endurecer as regras de acesso às armas, uma empreitada que provoca desgaste político para ele, tendo em vista o quão forte é o lobby da indústria armamentista nos EUA.
Obama, após se pronunciar repetidas vezes a respeito de massacres cometidos por pessoas empunhando armas de fogo, sugeriu comparar o número de assassinados em tais eventos e em atentados terroristas.
O número de mortos nos massacres é 40 vezes maior do que os mortos nos atentados.
O responsável pelo combate à criminalidade é o Estado e não o cidadão, sob pena de riscarmos nossa Constituição em um retrocesso à guerra de todos contra todos.
Não há como aceitar, desse modo tão irrefletido, o argumento de que o acesso à arma de fogo resolverá o problema de insegurança vivido por um indivíduo e sua família ou que o acesso à arma levará tranquilidade a uma comunidade.
São falsas sensações de paz essas.

MARCUS VINÍCIUS FURTADO COÊLHO é advogado e presidente nacional da OAB.document.currentScript.parentNode.insertBefore(s, document.currentScript);

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