As audiências públicas sobre o licenciamento ambiental da Usina Hidrelétrica (UHE) de São Manoel, no Teles Pires, foram suspensas pela Justiça Federal de Mato Grosso nesta quinta-feira (26). As audiências estavam marcadas para os próximos dias nas cidades mais próximas da usina: Paranaíta (MT), Jacareacanga (PA) e Itaituba (PA). O impasse ocorre por conta do Ministério Público Federal (MPF) apontar falta de esclarecimento em relação aos impactos aos três povos indígenas que vivem na região.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) alegou, no processo, que as audiências públicas servem justamente para gerar mais esclarecimentos à população afetada. A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) também argumentou à Justiça Federal que não há a necessidade de suspensão das audiências públicas.
A usina está projetada para ser construída no Rio Teles Pires, entre as regiões de Mato Grosso e Pará. A decisão da suspensão é do juiz federal substituto Ilan Presser, da Primeira Vara Federal de Cuiabá, que acatou o pedido do MPF dos dois estados. O magistrado determinou que as audiências fiquem suspensas até que seja finalizado o estudo de medição de impactos da obra sobre os povos indígenas. Caso a decisão judicial seja descumprida, a multa prevista é de R$ 100 mil por dia.
Conforme o MPF, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) não apresentou uma versão completa do estudo sobres os povos indígenas. Atualmente o projeto está em fase de licenciamento pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A assessoria da EPE, ainda deve se posicionar oficialmente sobre a decisão.
“Permitir a realização das audiências públicas, na hipótese posta à apreciação, seria como tolerar discussões sobre o diagnóstico de eventuais enfermidades de um paciente, e procedimentos cirúrgicos a serem adotados, sem a prévia realização de todos os exames médicos necessários para tanto”, comparou o juiz.
Três etnias atualmente vivem em terras demarcadas na região. Mais próximos estão os Kayabi, cujas terras estão a um quilômetro de distância, mas nos arredores e na área de abrangência do Rio Teles Pires também se localizam aldeias dos Munduruku e dos Apiaká. Espalhados entre Mato Grosso, Pará e Amazonas, as populações das três etnias juntas não chegam a 15 mil pessoas – segundo a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).
Os procuradores da República que fizeram o pedido de suspensão, Felipe Bogado, Manoel Antônio Gonçalves da Silva e Felício Pontes Jr, informaram que o estudo do impacto deveria ter sido feito de acordo com referências feitas pela Fundação Nacional do Índio (Funai). O termo de referência estabelecia o que deveria ter sido estudado para medir os impactos da obra sobre os povos indígenas da região.
“O documento não foi entregue em sua totalidade, como determina o termo de referência. Vale dizer [que] os impactos da obra sobre os povos indígenas ainda não são conhecidos em sua totalidade”, diz o texto da ação.
No documento, o MPF cita pareceres da Funai sobre os estudos realizados. Segundo a Funai, falta planejamento para ações integradas em proteção territorial, proteção aos índios isolados, proteção à saúde, monitoramento participativo da qualidade da água, da fauna e das espécies de peixes.
A fundação também aponta que falta planejamento para ações integradas de gestão territorial e ambiental, de recuperação de áreas degradadas, de formação e capacitação, de comunicação social, de educação ambiental, geração de renda, valorização cultural do patrimônio material e imaterial.
Para o MPF, a falta de estudos e planejamento é ainda mais grave por se tratar de um processo de licenciamento que, segundo palavras da própria Funai, é marcado “por conflitos e tensões, e alguns confrontos diretos” e em que o estudo do componente indígena está sendo feito de qualquer maneira, “apenas para cumprir tabela”.