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Ibama refuta conduzir licenciamento de exploração de potássio na Amazônia

O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) refutou por três vezes, num período de quatro meses, conduzir o processo de licenciamento da exploração de potássio na Amazônia, empreendimento a cargo da empresa Potássio do Brasil.

O órgão se eximiu da responsabilidade por duas vezes em dezembro de 2021 e por uma terceira vez em abril de 2022, apesar dos impactos do empreendimento em terras indígenas na região de Autazes (AM), entre os rios Madeira e Amazonas.

O MPF (Ministério Público Federal) no Amazonas acusa a Potássio do Brasil de cooptação de indígenas na tentativa de garantir o negócio de potássio na região. Em razão dessa cooptação, a Justiça Federal já determinou que a empresa devolva um pedaço de terra comprado de indígena dentro de um território tradicional.

A Potássio do Brasil é um empreendimento do banco canadense Forbes & Manhattan. Para tentar garantir a exploração mineral na Amazônia, a empresa buscou licenciamento junto ao Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas), o órgão ambiental local.

Para o MPF, a licença prévia emitida em 2015 é ilegal e todo o licenciamento deve ser feito pelo Ibama.

O mesmo entendimento tem o povo mura, diretamente impactado pelo negócio, segundo documentos da ação em curso na Justiça Federal.

A juíza federal Jaiza Maria Fraxe, responsável pela ação civil pública, manifestou em um despacho, em novembro, posição que vai na mesma direção. Ela determinou citação ao Ibama para participação no processo, em razão do pedido do MPF para que o órgão cuide do licenciamento do empreendimento.

Em nota ao jornal Folha de S.Paulo, o órgão afirmou que uma lei complementar de 2011 estabelece que o licenciamento não é de sua competência quando o empreendimento está fora de terra indígena. O Ibama destaca também uma portaria interministerial de 2015 sobre a atuação de órgãos do governo quando há impactos de grandes obras em terras indígenas, que, no seu entender, não lhe dá competência para licenciamento.

Já a Potássio do Brasil disse, em nota, que respeita o “território de atuação” das instituições brasileiras e que o Ipaam é o órgão competente para o licenciamento. O projeto aguarda a licença de instalação e não está em terra indígena, segundo a empresa. Consultas aos indígenas estão em curso, conforme a nota.

“A Potássio do Brasil adquiriu os bens na região de Autazes de maneira lícita e legítima, sem qualquer dolo ou coação, mediante processo de negociação envolvendo as partes interessadas”, afirmou.

A exploração de potássio na Amazônia tem amplo apoio no governo Jair Bolsonaro (PL). Um forte lobby foi feito por representantes da Potássio do Brasil, especialmente dentro do Palácio do Planalto.

O presidente defende mineração em terras indígenas por empresas como a Potássio do Brasil. Bolsonaro usou a invasão russa na Ucrânia para tentar fazer avançar o projeto de lei apresentado ao Congresso. O pretexto era diminuir a dependência à importação de fertilizantes –o potássio é base para fertilizantes utilizados na agricultura em larga escala.

Sob Bolsonaro, o Ibama flexibilizou a fiscalização ambiental, estabeleceu condições para anistiar multas e tenta se eximir de processos de licenciamento, como é o caso da exploração de potássio na Amazônia.

A Potássio do Brasil quer explorar potenciais minas de sais de potássio a menos de três quilômetros de uma terra indígena e chegou a operar dentro do território, segundo o MPF. A terra Jauary, em fase de delimitação e homologação, é uma das impactadas.

O empreendimento não pode prosperar enquanto não houver consulta formal aos indígenas da região, dentro do que estabelece a OIT (Organização Internacional do Trabalho), conforme acordo feito na Justiça.

Instrução normativa de 2021 prevê que o Ibama deve cuidar do licenciamento ambiental quando os empreendedores são os indígenas. “Com mais razão ainda deve haver o licenciamento quando o empreendedor é um estranho à cultura, território, ethos, organização e tradição do povo”, afirmou a juíza Fraxe na decisão que determinou a inclusão do Ibama nos autos.

Em 8 de dezembro, porém, o coordenador-geral de licenciamento ambiental de empreendimentos fluviais e pontuais terrestres, Régis Fontana Pinto, afirmou que a competência do Ibama existe apenas para projetos desenvolvidos dentro de terras indígenas.

“Somente os impactos ambientais do projeto de mineração incidiriam sobre as terras indígenas, o que, por si só, não atrairia a competência federal para o licenciamento ambiental do projeto”, afirmou. O coordenador disse que não haveria nem mesmo interesse de participar de inspeção judicial prevista para aquele mês.

Dois dias depois, o Ibama, representado por integrantes da AGU (Advocacia-Geral da União), contestou a decisão para inclusão no processo em curso na Justiça Federal.

A alegação foi de existência de “descentralização do licenciamento ambiental”, em que “um ente não pode imiscuir-se na competência de outro, sob pena de ofensa ao pacto federativo”. Outro argumento usado foi de que a exploração de potássio não ocorreria dentro de terra indígena, mas nas imediações.

VINICIUS SASSINE – FOLHAPRESS

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