Nelson Teich passou a considerar seriamente o desembarque do governo na terça-feira 12. “Entrou no campo do desrespeito”, desabafou o agora ex-ministro a um médico carioca de quem é colega há mais de duas décadas, referindo-se à sua relação com Jair Bolsonaro. “A ficha caiu. Ele entendeu que o presidente acha que pode mandar em questões altamente sérias e complexas mesmo sem entender nada sobre o assunto. Continuar no governo seria suicídio da reputação dele. E, se ele entrou no governo por ambições políticas, que foi o caso, acabaria enterrando a carreira antes mesmo de começá-la”, completou o mesmo médico a VEJA, sob condição de anonimato.
Teich ficou perplexo com a postura do presidente, que deixou claro que não precisa ouvir a posição do ministro da Saúde no meio de uma crise sanitária. Um dia antes, o presidente havia assinado o decreto que permite a abertura de academias de ginástica, salões de beleza e barbearias em todo país, sem consultar nem informar previamente o ministro.
Segundo o amigo, Teich relevou o episódio, considerando que a medida fosse apenas uma iniciativa política, ainda que atabalhoada, de Bolsonaro agradar seus apoiadores, que pedem o fim do isolamento. O ministro ainda entendeu que o decreto não surtiria grandes efeitos, já que prefeitos e governadores barrariam a abertura dos estabelecimentos na maior parte do país.
A atitude mais desrespeitosa, porém, ocorreu na noite de terça-feira, 12, quando o presidente discutiu o desempenho de Teich com um apoiador na porta do Palácio da Alvorada. Descontente com a postura do ministro, o homem instou Bolsonaro a avaliar o titular da Saúde. Perguntou o que o presidente estava achando do ministro e completou, “e essas declarações dele sobre lockdown”, referindo-se à afirmação de Teich, que admitiu que, a depender da situação da epidemia, o bloqueio total não pode ser descartado.
Bolsonaro respondeu que ainda “não podia cobrar muito dele”, deixando subentendido que não estava satisfeito com o ministro: “Ainda é cedo. Se coloque no lugar dele. Pegou uma situação complicada. O ministério da Saúde, em si, já é um problema, tendo em vista vícios que tínhamos aí. Ainda pega com a crise da pandemia. Não é fácil. Não posso cobrar dele muita coisa”.
Em seguida, ao ser lembrado por um jornalista que Teich só soube pela imprensa do decreto das academias, salões de beleza e barbearias, o presidente deixou claro que não considera importante ouvir a área da saúde. “Eu baixo o decreto”, disse Bolsonaro, gesticulando como quem assina um papel. E continuou: “O major Jorge (Jorge Oliveira, ministro da Secretaria Geral da Presidência) já se penitenciou. Faltou ele fazer o contato com o ministro. Não é porque faltou um contato que a gente vai desclassificar o decreto. Quantas vezes você chega em casa com um colega para o almoço e não avisa a esposa? Vai acabar o casamento por causa disso?”, finalizou o presidente.