A professora Dandara Caroline de Oliveira Lima, de 26 anos, e a aluna Cássia Cristine de Souza Silva, de 17 anos, do Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT) de Cáceres, município a 220 km da capital, estão trabalhando há cerca de um ano em uma ideia que visa auxiliar a vida escolar dos deficientes visuais. O projeto ‘Sida’ (Software de inclusão de pessoas com deficiência auditiva) começou há um ano e já está prestes a ser apresentado internacionalmente.
A dupla pensou em aliar o nome do software com uma questão gráfica. As informações sobre o conteúdo didático são representadas através de um site que tem vídeos falados em Libras (Língua Brasileira de Sinais) pela ‘Cida’, uma boneca animada por computador para deixar o conteúdo um pouco mais lúdico.
A ideia surgiu na Mostra Científica do Pantanal do ano passado e já alçou fama até fora do estado. Professora e discente participaram entre os dias 7 e 10 de abril do evento tecnológico chamado ‘Computer on the beach’, que foi realizado em Florianópolis. O trabalho rendeu para elas um segundo lugar entre apresentações científicas. A boneca Cida ganhou, recentemente, até uma versão física, levada pelas duas para o evento.
A professora Dandara, que leciona nas matérias de desenvolvimento de sistemas e informática, conta que o objetivo do projeto é contribuir com a formação escolar e acadêmica dos surdos.
Ela explica que o software funciona por meio de um site que consegue decodificar, através de palavras chaves, conceitos e explicações didáticas sobre várias matérias.
“O professor utiliza um microfone, conectado a um computador, fala a palavra-chave e destrava a aula em libras que é apresentada por meio de um vídeo com a nossa mascote Cida. Todo isso funciona depois da produção e cadastro da aula do professor no site”, explicou.
A docente, que é natural de São Jose dos Quatro Marcos, município a 343 km de Cuiabá, explica que antes do desenvolvimento do programa, ela e um grupo de alunas pesquisaram sobre várias deficiências e as tecnologias que auxiliam essas pessoas. Após chegar em um consenso, elas decidiram trabalhar com os deficientes auditivos.
“A vida escolar deles é muito complicada. Existe pouquíssimo conteúdo voltado para eles. Por causa disso, boa parte deles não concluem nem o ensino fundamental. E quem vê de fora pensa que é porque eles não querem. Na verdade, eles não conseguem porque o material não é adaptado”, afirmou.
Por causa disso, a professora defendeu que o foco do software é o conteúdo escolar e que os alunos não ficarão dependendo de um professor porque os interessados ainda poderão acessar o todo o material de casa, após se cadastrarem e escolherem a matéria específica.
Dandara contou ainda que irá apresentar a ideia internacionalmente no próximo mês. Ela e Cássia devem participar de um fórum de ciências em Cuba, no dia 27 de junho. “Nós estamos muito animadas com a ideia e pretendemos expandir nossas fronteiras com essa apresentação”, argumentou.
A estudante Cássia, que está no segundo ano do curso de informática no IFMT, contou que sempre pensou em produzir algo que pudesse auxiliar as pessoas com algum tipo de deficiência e a que a feira de ciências que participou foi a oportunidade perfeita.
A jovem, que é natural de Cáceres, afirmou que nunca havia saído nem da cidade natal quando, no mês passado, foi para Florianópolis apresentar a ideia. “Foi muito bom para a gente. Além dos vários contatos que fizemos e pessoas importantes da área que conhecemos, conseguimos um segundo lugar na categoria que disputamos. Foi tudo incrível”, relatou.
Ela revelou que a ideia por enquanto não tem patrocinadores e parceiros e que todo o financiamento tem sido feito com a ajuda de sua família e de Dandara. Entre as próximas missões das cientistas está conseguir a obtenção de parceiros e financiadores que queiram investir na ideia.
Cássia, que termina o curso no meio do ano que vem, relatou que pensa em fazer uma graduação em computação gráfica e que a única certeza que tem do futuro é que pretende seguir tocando o projeto Sida por um bom tempo.
“Estamos recebendo bastante reconhecimento, apesar de tudo ser tão novo. Pessoas da cidade e de fora que eu nem conheço já vieram me parabenizar pela ideia. Não passa na minha cabeça começar a me envolver de maneira séria com outro projeto, estou 100% focada nesse”, disse.
Didática
O professor Fábio Vieira de Souza Júnior, do curso de Letras/Libras da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), explicou que a principal dificuldade em relação ao aprendizado dos surdos é com o material.
“A disponibilidade do material é uma questão sempre complicada. Ele quase sempre está em língua portuguesa e às vezes é difícil para quem só fala Libras. Entre as lutas da comunidade está a tentativa de fazer com que o Enem possa ter uma edição em Libras”, afirmou.
Ele contou que no quesito tecnologia, aplicativos de vídeo chamada como o Face time e o Skype são bastante difundidos entre os surdos. Além disso, existem aplicativos para celular que realizam a tradução entre Libras e outras línguas.
Sobre o projeto Sida, Fábio lembrou que é preciso cuidar dos conceitos em relação ao conteúdo escolar, mas que a iniciativa é extremamente satisfatória. “Pode ser uma forma de criar convenções de sinais. Existindo um registro, pode ser que haja uma preferência das pessoas”, argumentou.
O docente também elucidou que apesar de certo temor social, o termo surdo é o preferido entre a comunidade. “Na verdade, deficiência auditiva nós usamos para um contexto mais clínico, médico. Surdos é um conceito mais cultural e que as pessoas que têm a condição acabaram adotando e criando uma identificação”, contou.
Fonte: G1 MT