É impressionante como, ano após ano, presenciamos tantas pessoas, solenemente, anunciarem suas resoluções de Ano Novo.
Parar de fumar ou de beber, praticar mais exercícios, perder peso, conviver mais com a família, retomar os estudos, buscar um emprego melhor, enfim, a lista é grande e todos vocês a conhecem.
Também na esfera pública assistimos governantes e parlamentares anunciando novos tempos, medidas de racionalização administrativa, contenção de gastos, combate a fraudes, exigências de qualidade na execução dos serviços, entre outros.
Todavia, passados alguns meses, às vezes só até o Carnaval, muitas dessas resoluções são silenciosamente abandonadas e volta a prevalecer a rotina dos velhos maus-hábitos, públicos e privados.
É claro que não é uma regra absoluta e testemunhamos muitos admiráveis exemplos de sucesso, mas por que isso acontece tantas vezes a tanta gente?
Há quem atribua o não cumprimento das resoluções de Ano Novo à falta de determinação e persistência dos indivíduos.
De fato, pessoas com vontade frágil desistem ante o primeiro contratempo, e os contratempos sempre são muitos na estrada da mudança.
Mudar exige muita energia para vencer a inércia, a acomodação e o conformismo. Isaac Newton, um dos maiores gênios da humanidade, demonstrou no século XVII que a inércia é um fenômeno real no mundo físico.
Posteriormente, as ciências sociais identificaram nas sociedades humanas a resistência arraigada às inovações, especialmente as que contrariam interesses estabelecidos.
Entretanto, muita energia apenas não basta para a mudança. É necessário ter direção, objetivos, metas. Saber aonde se quer chegar, por que e para que.
Em outras palavras, ter planejamento e fixar projetos realistas. Para um indivíduo de meia-idade como eu, uma coisa é almejar correr a São Silvestre daqui a um ano; outra, é sonhar com uma medalha olímpica na maratona.
Arcos-íris existem para ser contemplados e servir como inspiração; se perseguidos, desaparecem.
Tenho observado que grande parte das desistências em relação aos bons propósitos do Ano Novo decorre de frustrações maximizadas pelo sentimento de não poder alcançar metas superestimadas.
Às vezes, na hora de formular nossos votos, falta-nos a humildade para dimensioná-los à nossa efetiva capacidade de realização, bem como discernimento para distinguir entre o necessário e o ilusório.
Desejos excessivos convertem-se em aflições excedentes, insatisfações supérfluas, alimentando ansiedade e, frequentemente, depressão.
Em vez de valorizar e celebrar as conquistas possíveis, ainda que pequenas, e paulatinas, lamenta-se a utopia não concretizada.
Muitos não compreendem que as grandes mudanças começam com pequenos passos e atitudes. A preservação do meio ambiente avança com cada um racionalizando o uso de água e energia e reciclando seus resíduos, em casa e no trabalho.
A melhoria na gestão pública ocorre quando os servidores de terceiro escalão tratam os cidadãos e os seus subordinados com o mesmo respeito que dirigem aos seus superiores e quando se cuida do patrimônio público com o mesmo zelo dedicado à propriedade privada.
Se não podemos individualmente resolver problemas em escala global, está ao nosso alcance promover mudanças positivas na escala individual.
Se a ninguém é possível melhorar a situação de milhões de crianças sem lar, muitas famílias têm condições de adotar uma só criança e pelo menos a ela proporcionar amor e condições de desenvolvimento de seu potencial como ser humano.
Todavia, diversas não o fazem, justificando que mover um grão de areia jamais afetará a estrutura de uma montanha.
Equivocam-se. Não se vence um grande desafio sem enfrentar milhares de microbatalhas, a maior parte delas tendo como adversários nós mesmos e nossas limitações.
Ano Novo, vida nova? Sim, podemos melhorar individualmente e como sociedade se nos pouparmos das aflições excedentes e nos concentramos nas mudanças possíveis e cotidianas.
LUIZ HENRIQUE LIMA é conselheiro substituto do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT).